Com o aumento dos impostos a serem pagos, ainda vale a pena investir no exterior?
A novas normas de tributação do governo reduzem parte das vantagens anteriormente obtidas ao investir diretamente fora do país e podem direcionar o foco para os ativos locais.
Nos últimos anos, os brasileiros tiveram diversos motivos para começar a investir diretamente no exterior.
Com retornos anuais em torno de 30% no S&P 500, principal índice acionário da bolsa dos Estados Unidos, juntamente com uma queda histórica nos juros no Brasil em 2019 e uma rápida valorização do dólar frente ao real, a atratividade de alocar parte do portfólio no exterior se intensificou.
Entre 2019 e 2021, os brasileiros investiram aproximadamente US$ 35 bilhões em ativos internacionais, conforme dados do Banco Central.
Anteriormente, as bolsas estrangeiras eram muito populares, mas este ano o interesse se voltou para a renda fixa internacional, devido à alta de juros nos países desenvolvidos.
Com a possibilidade de cortes na taxa Selic, a diferença entre os juros locais e os internacionais pode diminuir ainda mais.
Até então, formas indiretas de diversificação para investir no exterior eram mais comuns, como investimentos em fundos internacionais e BDRs (Brazilian Depositary Receipts), que se tornaram acessíveis também aos pequenos investidores em 2020.
Com a internacionalização dos mercados e avanços tecnológicos, o investimento direto no exterior se tornou mais simples.
Além disso, a oferta de contas internacionais para pessoas físicas com remessas iniciais de valores mais baixos, a partir de US$ 100, permitiu aos pequenos investidores acessarem aplicações antes reservadas apenas aos mais abastados.
Complementando esse cenário, a legislação tributária brasileira, apesar de complexa, é mais branda na prática em relação aos impostos sobre ganhos e rendimentos recebidos do exterior.
Agora, uma alteração na legislação tributária pode colocar em xeque essa tendência de investir no exterior.
O governo federal publicou a Medida Provisória 1.171/23, que aumenta a faixa de isenção do imposto de renda para o trabalhador.
Porém, para compensar a arrecadação, a medida prevê, a partir de 2024, um aumento na taxação para investidores com recursos aplicados no exterior.
O texto tem até 120 dias para ser votado no Congresso, onde pode sofrer modificações. Somente após a aprovação, adquire status de lei e será detalhado com normativas que esclarecerão dúvidas sobre a proposta.
Embora o foco principal da medida seja as grandes fortunas que investem através de estruturas complexas, como empresas “offshore” e “trustes”, o investidor comum, que recentemente adotou contas no exterior, também enfrentará mudanças e pode precisar reavaliar suas estratégias e, possivelmente, reconsiderar a alocação de sua carteira.
Investir no exterior por meio de alternativas locais (como BDRs e ETFs) pode voltar a ser uma opção mais atraente em alguns casos.
Atualmente, a legislação tributária vigente impõe impostos para investir sobre dois tipos de receitas provenientes do exterior, cada um de forma específica.
O primeiro é o ganho de capital, que consiste no lucro obtido a partir da diferença entre o preço de compra e de venda de um ativo financeiro.
Entretanto, quando a soma dessas transações atinge até R$ 35 mil por mês, o investidor está isento de pagar imposto sobre esse ganho de capital.
Essa isenção permite realizar diversas pequenas operações ao longo do ano sem a incidência de imposto de renda.
Apenas quando a venda total de ativos, como ações e ETFs, supera os R$ 35 mil em um mês, é necessário acertar as contas com a Receita Federal.
Se o ganho for de até R$ 5 milhões, o imposto é de 15%. Para lucros maiores, a porcentagem aumenta.
O segundo tipo de receita oriunda de investimentos no exterior pertence à categoria de “rendimentos” e engloba dividendos, aluguéis e cupons, como são denominados os retornos pagos pelos juros dos títulos de renda fixa.
Pela regra atual, essa receita é incluída na declaração de imposto de renda da pessoa física de acordo com a tabela progressiva, com uma faixa de isenção de R$ 1.900 e impostos que podem alcançar 27,5%.
Além disso, sempre que houver saldo positivo, o investidor deve pagar o carnê-leão até o mês seguinte ao recebimento do retorno.
Investir e Aprovação da MP
Caso a MP seja aprovada sem alterações, os dois tipos de recebimentos (ganhos de capital e rendimentos) serão tratados da mesma maneira.
Ambos serão unificados em uma única tabela, com impostos variando de 0% a 22,5%, levando em consideração o valor ganho no exterior, incluindo a possível valorização da moeda estrangeira em relação ao real.
Se o lucro anual efetivamente recebido pelo investidor for de até R$ 6 mil, não haverá tributação. Para ganhos acima deste valor e até R$ 50 mil, o imposto será de 15%. Caso o montante do lucro recebido seja superior, o imposto será de 22,5%.
Investir – Usando como exemplo o mercado dos Estados Unidos, onde é comum o pagamento periódico de rendimentos, a vida do pequeno investidor ficaria um pouco mais fácil.
Afinal, ele não teria que pagar o carnê-leão sempre que houvesse algum ganho, como ocorre na regra atual. Pela MP, a prestação de contas ainda existiria, mas seria anual, no momento da declaração do imposto de renda.
No novo sistema, o valor da operação para investir deixa de ser considerado e apenas o saldo positivo efetivamente recebido entra no cálculo.
Portanto, se alguém vende ações no valor de R$ 50 mil e tem apenas R$ 5 mil de lucro naquele ano, continua isento.
Em contrapartida, o investidor poderá ser tributado por todos os ganhos, de qualquer tipo de aplicação financeira, que entrem em sua conta e ultrapassem a isenção de R$ 6 mil por ano.
Atualmente, uma pessoa que investe no exterior e se organiza consegue obter até R$ 35 mil isentos de imposto por mês.
Pela nova regra, um investimento hipotético de US$ 12 mil com rendimento de 10% no ano, incluindo a variação cambial, ficaria isento de imposto.
No entanto, uma aplicação de US$ 120 mil com o mesmo percentual de rendimento teria tributação equivalente a 15% dos ganhos.
O imposto sobre os ganhos com aplicações em modalidades de investimento locais que investem no exterior, como BDRs e fundos de investimento no exterior, é de 15%.
Investir – Nesse último caso, entretanto, apenas para os fundos que investem exclusivamente em ações. Se o fundo atuar em vários mercados, o investidor precisa manter a aplicação por um prazo superior a dois anos para alcançar a tributação mínima, assim como ocorre nos demais tipos de fundos.